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os agilistas

#147 – Jobs to be done

#147 – Jobs to be done

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Marcelo Szuster: Bom dia, boa tarde, boa noite, vamos começar mais um
episódio de Os Agilistas. Hoje, nós vamos mais uma vez falar sobre gestão
de produtos, que é um tema tão importante hoje para todas as empresas.
A gente sabe que as empresas, para caminharem nessa jornada de se
tornarem digitais, se tornarem mais customer centric, tanto para atender
os próprios clientes internos, quanto os clientes externos, cada vez mais
elas têm que ter uma visão mais de longo prazo, pensar menos em projeto
e mais em produto. Então, esse é um tema que acaba sendo recorrente, a
gente já fez outros episódios aqui, e, hoje especificamente, a gente quer
falar sobre como é que a gente no final das contas entende, encontra
realmente as necessidades dos nossos usuários e dos nossos clientes, como
é que a gente faz para realmente descobrir isso. Para poder falar sobre esse
tema, como sempre, aqui o Vinição. E aí, Vinição, beleza?
Vinícius Paiva: E aí, pessoal, tudo bom?
Marcelo Szuster: E temos aqui dois representantes da DTI, com muito
conhecimento teórico e prático de gestão de produtos, que vão se
apresentar agora para a gente poder começar a conversa logo na
sequência. Estamos aqui com Daniel Leto. Tudo bom, Leto.
Daniel Leto: Opa, Szuster.
Marcelo Szuster: Se apresente, por favor, cara. Fala rapidinho sobre o seu
background, só para o pessoal te conhecer.
Daniel Leto: Eu sou product manager aqui na DTI, estou aqui desde o início
deste ano. Trabalho com gestão de produtos desde o final de 2018. Sou
engenheiro de formação, passei muito tempo indo para a indústria,
vestindo as botas, os antichamas, capacetes, conheço um pouquinho da
realidade, mas aí vim para essa área de produto, que é um negócio que me
deixa bastante empolgado. Especificamente, gosto bastante da área de
dados, hoje estou até fazendo mestrado em matemática computacional. É
mais ou menos isso aí.
Marcelo Szuster: Qual engenharia?
Daniel Leto: Engenharia elétrica.
Marcelo Szuster: É a melhor, não é, cara? É a que eu fiz também. Essa é uma
brincadeira que eu sempre faço. Estamos aqui também com Vinícius Barbi.
E aí, Barbi, tudo bom?
Vinícius Barbi: Fala aí, gente, tudo bem? Não sei nem se eu tenho roupa
para estar aqui.
Marcelo Szuster: E aí, Barbi? Aproveite e se apresente aí também, cara,
conta um pouquinho sobre o seu background.
Vinícius Barbi: Eu me formei em design gráfico e, desde a formação, fui cada
vez migrando para o lado do digital de alguma forma. Passei um tempo da
minha carreira trabalhando com animação e foi isso que acabou me
jogando dentro de interfaces e experiência do usuário. Quando cheguei na
DTI, comecei a atuar como designer de produto e agora também estou
fazendo um pouco de um trabalho que a gente fez de transformação digital
dos clientes.
Marcelo Szuster: Então, pessoal, vocês veem, nós temos duas pessoas
trabalhando com produtos, de áreas diferentes, de backgrounds diferentes,
e isso é uma coisa que a gente cada vez mais vê acontecendo na DTI e nesse
mundo do digital. Várias transições de carreira e várias trajetórias bem
interessantes. A gente já falou também muito sobre isso aqui, no podcast.
Eu queria começar fazendo pergunta para o Leto sobre como que a gente
entende, de fato, as necessidades do cliente? Existe a teoria do jobs to be
done, seria interessante você explicar isso. Porque é uma pergunta
interessante, ou seja, o que é uma necessidade mesmo, como é que a gente
faz para entender isso, é só perguntar para um cliente ou para um usuário
o que ele quer ou tem que descobrir de alguma outra forma? Como é que
a gente lida com isso, Leto?
Daniel Leto: A resposta curta para essa pergunta é não, não é só perguntar
para ele. Mas a boa notícia é que a gente tem algumas técnicas que
permitem que a gente seja um pouco mais assertiva em identificar o porquê
de as pessoas comprarem o produto. Contando uma historinha rápida, não
tem como a gente falar de jobs to be done sem falar do Clayton Christensen,
que foi um professor da HBS, Harvard Business School, que foi o pai dessa
teoria. Ele tinha uma empresa de consultoria que atendia grandes
empresas. E a história de como surgiu essa questão de teoria do trabalho,
que nada mais é do que um trabalho de empatia com os seus usuários, foi
quando ele foi chamado para dar consultoria no Mcdonalds, e o Mcdonalds
queria aumentar a quantidade de vendas do milkshake que eles tinham. O
Mcdonalds, eu acho que não é segredo para ninguém, é uma empresa
gigante, eles têm um zilhão de dados na base deles. O que eles fizeram foi
rodar aquele método tradicional: fizeram uma pesquisa de satisfação com
os usuários, no caso, quem ia comer no restaurante deles lá, e coletaram
alguns feedbacks, perguntaram para alguns usuários e fizeram as
modificações de acordo com o feedback que o pessoal deu. Para a surpresa
da equipe, as vendas não aumentaram em absolutamente nada, mesmo
depois de ir colocando coisas mais legais, colocando milkshakes mais
pedaçudos, et cetera. Então, o que eles fizeram? Ao invés de eles
simplesmente perguntarem para as pessoas, eles colocaram uma equipe
fazendo sombra. Sombra, para quem não sabe, é quando você vai para
campo, vê o usuário utilizando o seu sistema, no caso, acompanhando as
pessoas na jornada delas completa. Fizeram as perguntas, foi uma sombra
até que eles ficam se gabando, de 19 horas direto, chegaram lá bem de
manhã, cedinho, e começar a perguntar para as pessoas. Anotar: chegou de
carro, chegou a pé, veio sozinho, veio de galera, tomou só o milkshake, ficou
aqui na loja e levou para fora, que é o tipo de coisa que a gente não costuma
pegar com dado, não seria possível de fazer isso, ainda mais na época que
isso foi criado. Se eu não me engano, foi em torno de uns 15 a 20 anos atrás
esse episódio. E para a surpresa do pessoal, a maioria dos milkshakes era
consumido na parte da manhã, por pessoas que chegavam sozinhas e de
carro. Quando eles fizeram esse compilado dessas informações, com
entrevistas de campo em conjunto com os dados que eles avaliaram. Então,
eles começaram a perguntar por que as pessoas estavam consumindo
milkshake de manhã e sozinhas, porque não é um negócio que é óbvio.
Mesmo para a cultura gastronômica do pessoal dos Estados Unidos, é um
negócio que é relativamente pesado para você começar o dia. Algumas
pessoas falaram que: eu como banana, mas banana me dá fome no meio
da manhã; eu como bagel, mas eu já levanto de casa atrasado e bagel, para
quem não sabe, é uma rosquinha salgada, parece um pão, muito seco, e
eles tinham que dirigir passando cream cheese no negócio ao mesmo
tempo, não dava muito certo; tinha gente que comia Snickers. Enfim,
tinham diversos outros produtos que eram contratados para esse trabalho,
para ajudar os usuários a fazerem coisas mais legais. E descobriu-se, então,
que, na verdade, as pessoas não compravam milkshake através desses
dados. A conclusão que a equipe de consultoria chegou foi que as pessoas,
na verdade, elas contratavam o milkshake para fazer companhia para elas
no caminho para o trabalho e, de quebra, a maioria das pessoas ficavam
cheia até mais ou menos na hora do almoço e tinha alguma coisa para
manter distraído. Então, o que a equipe fez? Ao invés de fazer essas
modificações do Mcdonalds, de colocar mais caramelo, essas coisas assim,
eles colocaram coisas que manteriam as pessoas mais distraídas no
caminho para o trabalho. Então, reduziram a espessura do canudo,
colocaram uns pedaços de frutas, não por ser saudável, mas por ter coisas
para mastigar para você se distrair, e colocaram uma fila de, se eu não me
engano, self-checkout para as pessoas que fossem comprar essa parte das
sobremesas. Resultado: as vendas explodiram e todo mundo ficou feliz no
fim das contas. Moral da história: as pessoas não contratam o seu produto,
elas pegam o seu produto emprestado para fazer a vida delas melhor de
alguma forma. E é daí que saiu essa tal dessa teoria do jobs to be done.
Marcelo Szuster: Interessante. Eu lembro dessa história também que, num
outro horário, sei lá, tinha uma parte assim também, o Vinição inclusive
deve vivenciar, agora na pandemia não, era o contrário: o cara leva o filho
depois do dia de trabalho, está cansado, e aí o job to be done é ele ter um
entretenimento com o filho. E aí, se você desse o mesmo milkshake que o
cara demora para tomar, o menino não consegue tomar e a vida vira um
inferno, porque você não consegue ficar com as crianças num lugar desse
muito mais que meia hora, uma hora, que eles vão ficando incomodados.
Então isso, eu acho que tem uma mensagem interessante sobre, no fundo,
o produto não tem necessariamente um valor intrínseco, não é? A gente
tenderia a pensar que sempre o job to be done seria que ele tem que
cumprir um desejo e um gosto bom do milkshake. Eu falo assim, a tendência
de todo mundo, não sei se vocês concordam, é pensar muito assim: se eu
tiver o melhor milkshake do mundo, pronto, resolvi o problema. E não é
isso. O que o Mcdonalds fez, que você está falando, foi que de manhã cedo
era melhor um milkshake espesso, que durasse mais, para o cara ter
companhia, e num outro horário é melhor um milkshake para criança, que
pode ser até mais doce mesmo, que criança gosta de coisa mais doce, não
é?
Vinícius Paiva: Deixa eu só fazer uma observação aqui, nem tem a ver com
para onde o assunto caminha, mas é uma analogia boa. Eu não sei o tanto
que você está avacalhado do jejum intermitente, mas eu ainda estou
tentando seguir um pouco. Mas aquele cara, eu acho que você leu o livro
também, David Sinclair, Lifespan, esses dias ele postou no Twitter, ele fala
assim, take hot drinks, alguma coisa assim. Que, no fundo, ele cumpre esse
papel, o hot drink cumpre esse papel de não que ele vai te saciar, é um
pouco desse papel da companhia, ele tem o papel da pausa, daquele ritual
de você fazer uma pausa e tomar alguma coisa. E, por exemplo, para mim,
funciona muito bem. De manhã, eu antes fazia exercício, para cumprir o
ritual de fazer alguma coisa de manhã, eu tomo um café e me satisfaz a
necessidade de ter aquela pausa, aquele rito.
Marcelo Szuster: E se é quente, você toma devagarinho, não tem como, a
não ser que você seja um pouco doidão. (Inint)  perguntando, só
para eu colocar o Barbi na conversa também, se ele concorda com essa
questão desse valor intrínseco, ou seja, então a gente tem que talvez tirar
o foco desse valor intrínseco e pensar a partir de uma outra perspectiva. É
isso mesmo?
Vinícius Barbi: Eu acho que é. Eu acho que, na verdade, essa questão do
jobs to be done ela acaba ajudando a gente a entender qual é o valor de
verdade que aquelas pessoas veem naquele produto. Que talvez, se a gente
fosse falar do milkshake, pensando na experiência de consumir esse
milkshake, a gente nunca diria que um milkshake cheio de pedaço, que dá
trabalho de conseguir consumir, que vai te fazer demorar, se você não
soubesse dessa relação dos usuários com isso, você nunca diria que esse é
o melhor milkshake. E, no fundo, o melhor produto ali, naquele momento,
era um produto que desse trabalho, que está muito longe do que a gente
imagina de experiência ideal.
Daniel Leto: O que acontece é que muita gente acaba acertando sem
querer, não é? Vende muito e acha que é por conta de uma característica,
mas na hora que você vai ver é por causa de outra.
Marcelo Szuster: Frustrante, não é? O cara, achando que é o rei dos
milkshakes.
Vinícius Barbi: Ele só fez um milkshake que dava trabalho de beber.
Marcelo Szuster: É, nesse caso, é até irônico, não é? Aumentou a fricção. A
gente fala que tem que diminuir a fricção para tudo, nesse caso aumentou
a fricção para o consumo do milkshake. Vocês conseguem pensar agora em
algum exemplo mais próximo que vocês tenham vivenciado no mundo de
produtos digitais, onde essa abordagem tenha mostrado uma diferente
necessidade?
Vinícius Barbi: Eu acho que eu tenho um exemplo que a gente vive muito
no cliente que é a tal da planilha do Excel. Se você perguntar para todas as
pessoas que a gente tem entrevistado dos nossos produtos, ou nas áreas
que a gente tem atuado, todo mundo fala que o que eles têm que fazer é:
eu preciso colocar esses dados do Excel em algum lugar. E quando você vai
ver e avaliar aquilo ali a fundo, nunca é sobre escrever o dado no Excel, é
sempre sobre alguma coisa que está por trás daquilo, ou uma análise que
vai ser feita, ou alguma forma que aquele dado vai ser transformado e
alimentar algum outro processo. Eu acho que acaba tendo um pouco disso
no dia a dia, de entender a motivação por trás de alguém está fazendo o
que ela faz, ajuda a gente a fazer um produto que às vezes a pessoa nem
esperava que podia ser um produto. No fundo, as pessoas estavam achando
que elas iam ganhar uma planilha do Excel melhorada, e aí você faz um
outro produto que não tem nada a ver com aquilo, que é sobre visualização
de dados ou sobre a automação de algum outro processo que estava no
backstage desse processo, e que acaba sendo ali que se gera muito valor
mesmo.
Daniel Leto: É impressionante como é que a gente vivencia isso,
especialmente em clientes mais tradicionais. Quando a gente está falando
de consultorias ou integradoras de software, eu escutei alguém falando
esses dias, a gente normalmente chega enxergando só um pedacinho da
jornada. Porque como é que normalmente nascem essas coisas? Alguém
tem alguma ideia nas áreas de negócio, o pessoal junta com a TI, decide o
que vai ser feito e só na hora de implementar, na hora de fazer o delivery
de fato, eles entregam para uma empresa terceirizada, para ela poder fazer
o desenvolvimento do software, mas esquece que parte do ganho vem
justamente de todos os atores envolvidos em todas as etapas. Esse exemplo
que o Vinícius deu é excelência, da tal da planilha de Excel. Esses dias eu vi,
inclusive, uma demanda que chegou mais ou menos assim para a gente: a
gente precisa implementar essa integração com essa planilha de Excel. Era
um negócio que era até legal, ele puxa os dados da planilha do Excel e você
consegue fazer os lançamentos através de uma ferramenta que todo
mundo usa. Mas, na prática, o que o pessoal precisava já existia em outro
sistema, mas eles não usavam porque eles precisavam logar em outro
sistema. Às vezes, o produto que as pessoas contratam, a teoria do trabalho
fala muito disso, ele só é contratado a partir do momento que ele é tão bom
ou melhor do que as pessoas já fazem. Então, se as pessoas já usam a
planilha de Excel, para que eu vou logar em outro lugar, mesmo que dê mais
trabalho para mim, não é? O gatilho mental, o esforço que isso leva, ele é
simplesmente muito maior do que simplesmente continuar fazendo as
coisas na rotina.
Vinícius Paiva: Vocês citaram esse exemplo do milkshake, que o pessoal
identificou essa questão da necessidade muito baseado em observação. O
que vocês diriam sobre método para isso? Normalmente, é mais por
observação, é mais, vocês falaram no início, sobre a questão de
questionários. Qual é o papel de você fazer via questionário, qual é o papel
de você fazer de uma forma talvez um pouco mais sofisticada, mais baseada
em comportamento?
Vinícius Barbi: Eu acho que assistir as pessoas fazendo o que elas fazem em
algumas situações vão render esse tipo de informação para a gente, que eu
acho que é a situação do Mcdonalds. Mas tem horas que a gente precisa de
uma entrevista em profundidade, entender um pouco do negócio que está
acontecendo em volta daquilo que está sendo feito. Eu acho que essa
pesquisa, não só necessariamente perguntando para alguém, mas uma
pesquisa de compreender do negócio e aprender realmente sobre aquilo,
pelo menos me ajuda demais a entender esses jobs to be done das coisas
que a gente tem feito. Principalmente se é algum processo complexo,
alguma coisa que não é óbvia, não está muito no nosso dia a dia se a gente
não trabalhasse com as equipes que a gente trabalha, é muito difícil você
escutar alguém falando que ela vai preencher uma planilha e associar com
a razão real daquilo que está sendo preenchido ou onde que aquilo gera
valor.
Vinícius Paiva: É por isso que a gente reforça muito essa ideia da filosofia da
TI de trazer os líderes para as trincheiras também, justamente para a gente
poder ter uma visibilidade. E aqui, a gente não está desprezando a
importância de decisões data driven, pelo contrário, só que a gente sabe
bem que computadores são limitados perto do que a ação humana pode
fazer de fato. E, dentro do que o Vini até mencionou agora, além disso tudo,
muitas vezes a gente consegue chegar nesse tipo de coisa perguntando o
porquê. Normalmente, a gente pergunta: o que você quer que constrói?
Mas, na prática, o que a gente deveria estar perguntando? Por que você
precisa disso? Porque isso dá muito mais margem para as pessoas terem
amplitude de responder coisas que você não perguntou.
Vinícius Barbi: É: por que você faz o que você faz no trabalho?
Marcelo Szuster: Pessoal, queria lembrar a todos que estão nos ouvindo
que os episódios de Os Agilistas também estão disponíveis no Youtube. Lá,
você assiste esse e outros episódios, além de ter acesso ao conteúdo de
nosso podcast de forma visual. Além de nos ouvir, agora você pode nos
assistir, é só procurar Os Agilistas, se inscrever e ativar as notificações para
receber nosso conteúdo em primeira mão.
Marcelo Szuster: Isso traz outros problemas sérios que a gente vê que as
organizações têm que precisam ser combatidos. Ou seja, um é sobre a visão
fragmentada, vocês acabaram citando isso. Poxa, às vezes a pessoa que está
pedindo ali tem uma visão fragmentada, é um negócio curioso. Eu já
participei de dinâmicas aqui que, na dinâmica que envolvia o líder, ou seja,
a gente deu um jeito de trazer o líder para a trincheira, pelo menos durante
a dinâmica, foi a primeira vez que alguém descobriu certas intenções da
liderança, o que, no fundo, estava por trás do que ele fazia. Porque nesse
modelo mais mecanicista, acaba que muitas empresas são construídas
assim. Se o cara está fazendo o pedacinho dele, está bom e ele fica sem
saber o porquê e tem uma visão fragmentada. A outra, emendando com
isso, é justamente esse porquê. Tem empresa que se o cara perguntar por
que, é quase que ele está sendo ineficiente. O cara é tarefeiro, ele tem que
ser, você tem que fazer, você não tem que perguntar por que. Então é
curioso, porque isso mostra que para você fazer um bom produto, que
realmente atenda às necessidades de negócio da empresa, e
consequentemente quem está desempenhando aquele determinado
papel, você tem que ter essa visão de tentar quebrar essa fragmentação e
trazer mais conhecimento. Então, eu imagino que essas ferramentas de
jornada, de empatia com persona, tudo isso contribui como método
também, que tinha a ver com a pergunta do Vinição, para poder aproximar
mais da possibilidade de responder essas perguntas. Vocês concordam?
Vinícius Barbi: Eu concordo demais. Todo o trabalho que a gente faz quando
a gente olha para o lado de design, de entender necessidade de usuário,
mapear persona, enfim, essa proximidade com o usuário, eu acho que está
diretamente relacionado com o que a gente faz quando a gente fala de jobs
to be done. Porque se você não entende como aquela pessoa pensa, por
que ela faz as coisas, você não vai conseguir criar nem empatia com o que
aquela pessoa precisa fazer para que realmente se faça um bom produto.
Não sei se o Leto tem algum outro ponto.
Vinícius Paiva: É exatamente isso em termos práticos. Porque quando a
gente fala disso, algumas pessoas podem pensar: está abraçando árvore.
Não é bem assim, especialmente em ambientes mais conservadores.
Muitas vezes, o que isso quer dizer na prática, usar a teoria do trabalho, é
a gente trazer uma reunião semanal que envolva o time técnico também. A
gente fala aqui muito, na nossa tribo, que discovery não é uma atividade de
design, por exemplo, discovery é uma atividade do time inteiro, é uma
filosofia, todo mundo tem que estar ali avaliando quais são os quatro riscos
de produto. Pensando um pouquinho em golden circle, que as pessoas
compram o porquê de você fazer as coisas, isso vale mesmo para ambientes
internos, de produtos business to employee. Às vezes, na prática, isso quer
dizer trazer o cliente para dentro também, ou o time para fora, colocar todo
mundo para conversar justamente para gerar essa empatia. Quantas vezes
já não aconteceu, às vezes não precisa ser nem no trabalho. Você fica bravo
com alguma coisa e na hora que você conversa com a pessoa você descobre
que ela tem motivo para aquilo. É a mesma coisa aqui.
Vinícius Paiva: Eu ainda fico um pouco intrigado sobre essa questão. Vocês
colocaram esses métodos de questionamento, tentando chegar no porquê,
eu fico pensando assim, tudo bem que nesse exemplo que vocês deram do
milkshake, foi uma observação quase que do status quo, uma coisa que já
estava sendo executada. E quando é uma coisa, você está inventando
alguma coisa, as pessoas vão acabar criando uma série de narrativas. Ela
não sabe bem o porquê, mas ela vai ficar: eu acho que é por causa disso.
Ela vai ficar respondendo alguma coisa ali que ela racionalizou. Fica me
parecendo que tem um papel gigantesco de importância em relação a
observação e experimentação de propostas. Vamos tentar esse aqui, não
vou ficar perguntando, vou observar o comportamento, como que a pessoa
reage em relação a isso, até descobrir alguma necessidade. Como a gente
tem clientes, negócios que o pessoal está inventando produtos novos,
formas diferentes de gerar receita, o ambiente é bem mais desestruturado.
Eu queria só que vocês explorassem um pouco mais o papel disso. Inclusive,
o Leto colocou essa questão de negócios B2E, ou até negócios B2B, onde o
universo de experimentação é pouco mais restrito, como é que funcionaria
nesses casos? Como é que vocês abordam esses problemas?
Daniel Leto: Essa é a pergunta de um milhão de dólares: como é que a gente
descobre esses jobs to be done? Na verdade, tem várias formas. Mas,
quando a gente está falando de produtos mais novos, uma coisa que a
gente já descobriu aqui que tem chances boas de funcionar, que a gente
não trabalha com certeza, mas com validação de hipóteses, é a gente
trabalhar com uma visão de produto que gaste pouco, mas seja efetiva. O
que eu chamo de visão de produto? Não estou falando de uma lista de
requisitos, eu estou falando de uma coisa que seja inspiradora para as
pessoas, principalmente quem for comprar a ideia, que efetivamente for
pagar a conta, é isso que eu preciso. Ou, no mínimo, a pessoa vai ver aquilo,
que é o nosso entendimento, DTI, em relação àquele problema, depois de
uma série de problem framings, e fala: não, isso não me atende, eu queria
isso. Isso ajuda a gente a direcionar melhor. É óbvio que se a gente tiver um
gestor com bastante poder que já esteja enviesado, a gente vai acabar
fazendo o que foi feito para fazer, e pode ser que ele tenha motivo para
aquilo, esse motivo pode variar desde motivos pessoais dentro da empresa
de crescimento, até outros motivos, como por exemplo ter que fazer o
desligamento de alguma coisa que vai dar muito problema se não desligar.
Nessas horas, a gente tem que ficar de olho, tentar entender por que essas
visões chegam enviesadas. Mas, na prática, uma visão de produto pode ser
um protótipo de alta fidelidade. A gente tem caso bom de sucesso aqui que
ao invés de a gente propor uma série de requisitos, a gente chegou lá e
apresentou na reunião um protótipo navegável de alta fidelidade. O pessoal
bateu o olho e falou: é exatamente isso que eu preciso. E deram os devidos
feedbacks.
Vinícius Barbi: Esse tipo de protótipo, quando a gente não tem muito,
vamos falar assim, uma diretriz clara, ele era um protótipo de muito alta
fidelidade, mas não fidelidade técnica, a gente não tinha muita certeza se
os requisitos técnicos eram realmente aqueles ou não. Ele estava ali muito
só para tentar suprir o que a gente escutou durante o processo de
discovery, que eram as dores, as necessidades das pessoas que estavam ali
envolvidas. Então a gente estava, no fundo, tentando entender ainda um
pouquinho o porquê as pessoas faziam o que elas faziam.
Marcelo Szuster: Interessante esse ponto seu. Desculpa, completa aí, Barbi.
Eu chamo você de Barbi e Leto chama você de Vini.
Vinícius Barbi: O pessoal que estiver ouvindo vai achar que tem, no mínimo,
umas sete pessoas participando da ligação. A gente estava só fazendo um
protótipo que servia para mostrar um pouquinho que isso aqui é o que a
gente entendeu do que você falou para a gente. A gente vai tentar detalhar,
refinar e tentar entender as minúcias técnicas de como executar e até talvez
algumas das definições, mesmo que fossem visuais, mais para frente. A
gente só precisa que você confirme para a gente: a gente entendeu direito
o que você precisa disso?
Marcelo Szuster: Estamos no caminho certo? Esse ponto eu acho
superinteressante. É por isso que o processo se chama descoberta,
ninguém sabe, está descobrindo. E descobrir significa entender
gradualmente. Eu acho que isso é uma outra dificuldade que existe, porque
muitas vezes já se espera que se saiba a solução imediatamente ou que, ao
fazer um discovery, o discovery vai ser uma mágica, você já vai sair de lá
com uma solução. Se você pensar na palavra descoberta, é assim: juntos
estamos descobrindo. Esse protótipo mostra que entendemos até aqui,
será que o caminho é esse? Parece que é. Isso é difícil de convencer as
pessoas por causa dessa necessidade de certeza. Aí vai lá no episódio da
maldição do escopo, remete a um tanto de coisa. Mas, vocês concordam?
Eu acho que esse ponto, é muito interessante para quem está ouvindo
refletir sobre isso. É igual quando a gente fala que hipótese é diferente de
requisito, quando você bota hipótese ou já muda a linguagem. Quando você
fala num processo de descoberta, eu acho que todo mundo deveria
entender que já se parte de uma posição de saber o seguinte: eu não sei
exatamente o que eu quero, eu tenho que ir descobrindo. Inclusive, a gente
defende que a descoberta seja contínua, porque com um produto mais
complexo, de longo prazo, você vai fazer várias descobertas, não é só uma.
Como é que vocês enxergam isso?
Vinícius Barbi: Eu acho que não só tem esse apreço, amarração, não sei qual
é a palavra, com saber a solução, mas como se tenha uma única solução.
Quando a gente fez esse processo que a gente citou, eu acho que a gente
tinha uma lista de quatro ou cinco coisas que a gente entendia que
resolviam de alguma forma aqueles problemas que a gente estava ouvindo
e a nossa expectativa era validar uma depois da outra. Era testar uma,
entender se era aquilo ou não, testar a próxima e a próxima. Eu acho que é
um pouco perder até essa expectativa de que tenha que ter uma resposta
única. No final das contas, a gente descobriu que tem N outras coisas que o
produto pode fazer no futuro, mas só que uma delas respondia de imediato
a necessidade.
Daniel Leto: A gente até cai naquele clichê de a gente apaixonar pelo
problema e não pela solução. Mas mesmo esse tipo de clichê é um negócio
que não está bem fundamentado na maioria dos lugares. Por que eu estou
falando disso? Porque na hora que você para para pensar, processos de
discovery são muito parecidos com processos de método científico, que é
um negócio que não é novo para ninguém. O que, na prática, você faz é
você entende um problema que você tem, você modela esse problema e
depois você ataca esse problema com possíveis soluções da forma menos
enviesada possível. E acaba caindo nisso que o Barbi mencionou de a gente
não ter uma solução única, às vezes tem mais de uma forma de a gente
resolver o mesmo problema e a gente tem que estar sempre aberto a
conseguir pivotar se a gente achar alguma coisa melhor. Obviamente,
avaliando o custo que a gente vai ter de pivotar, dependendo de qual fase
de implementação, de delivery a gente estiver. Eu sempre brinco com a
galera, às vezes pivotar ou desistir de alguma coisa que a gente vê que não
está dando certo é um ato de coragem também. Você falar, isso aqui não
vai funcionar, isso aqui não faz sentido eu conseguir, é falar a verdade e
tentar ser transparente em relação a isso também.
Vinícius Barbi: Essa diversidade de soluções, eu acho que ela também tem
muito a ver com a gente estar tentando criar um produto em volta de um
trabalho, de um job to be done. Quando a gente tenta fazer uma tarefa, ele
vai ter uma cara muito mais rígida, a solução vai parecer muito mais rígida,
ela não vai ter essas múltiplas possibilidades diferentes de resolver o
mesmo problema. Porque, no fundo, você estar digitalizando uma tarefa é
isso, é digitalizar ela, é pegar o dado e escrever na planilha. Quando você
tenta resolver o job to be done da pessoa, é muito além disso. Você pode
ter um produto que seja escrever na planilha, o outro que seja movimentar
o dado de uma outra forma, ou que possa até ser mudar a forma como o
dado é coletado, talvez também resolva o problema do mesmo jeito. Eu
acho que começa a ter essas várias características de soluções de produto
muito diferentes porque a gente, durante o processo de discovery, a gente
foi pensando o que era esse job to be done.
Daniel Leto: Talvez valha a pena a gente explicar para os ouvintes, isso é
uma confusão comum, qual que é a diferença de tarefa para trabalho.
Vinícius Barbi: Talvez faça sentido. Foi a hora que eu entendi o que era a
diferença dessas duas coisas que ficou claro para mim: ok, é por isso que o
Leto não para de bater nessa tecla. O cara não parava de falar de jobs to be
done e eu não entendia o porquê que isso era tão relevante. Não me
parecia importante, aí eu falei: não, entendi, é por isso, é porque tarefa e
trabalho são duas coisas completamente diferentes. Não sei se você quer
explicar a diferença.
Daniel Leto: Eu achei que você fosse explicar.
Vinícius Barbi: No próximo episódio.
Marcelo Szuster: Explica aí.
Vinícius Barbi: Estou gerando engajamento.
Daniel Leto: Eu vou botar a galera para queimar um pouquinho de fosfato
porque isso não é algo trivial. É simples de entender, mas na prática, a gente
aplicar, nem sempre é isso. Mas tarefa é qualquer coisa repetitiva, que você
vai fazer no dia a dia. Exemplo, de novo caindo nos clichês, mas eu acho que
vale a pena a gente repetir até isso ficar internalizado, por que as pessoas
compram uma furadeira? É uma pergunta filosófica até, mas muita gente
vai responder: para fazer o furo. Mas furo é uma tarefa, você precisa fazer
o furo para fazer alguma coisa, ninguém faz um furo na casa porque acha
bonito, para decorar. Pelo contrário, se eu fizer isso aqui a minha esposa vai
me botar para fora de casa.
Marcelo Szuster: Você tem vontade de fazer um furo aí.
Daniel Leto: Primeiro que vai fazer barulho, segundo que vai fazer sujeira,
terceiro que vai ficar muito feio. Mas todo mundo quer instalar um suporte
de TV, e você descobrir qual suporte de TV que as pessoas querem instalar,
isso é o trabalho. Parece abstrato, mas é muito mais fácil a gente definir
com exemplos. Então, sugestão para quem estiver nesse meio de produtos
e tentando fazer transformação cultural é tenta encontrar qual suporte de
TV seus usuários estão tentando instalar.
Marcelo Szuster: Isso que eu acho engraçado. Por que isso é tão difícil de
fazer no mundo corporativo e no mundo mais tradicional? Porque é um
foco tão grande na eficiência e em tudo estar tão predefinido que às vezes
essa pergunta é quase inaceitável. Eu acho importante trazer isso à tona,
por quê? Se alguém está investindo num produto digital e quer fazer a
diferença, ele tem que abrir espaço para poder reavaliar o trabalho e não
só digitalizar a tarefa. Eu até entendo, a gente até teve discussões assim,
pode ter momentos que você precisa de um ganho imediato. A gente é
pragmático, então pode ter momentos que você precisa de um ganho
evidente ali, você vai seguir o caminho mais evidente e falar: digitaliza isso
aqui que eu preciso disso. E não vai ter que dar, talvez, esse passo atrás.
Mas quando você pensa em uma transformação maior, mais profunda, você
tem que abrir espaço para esse tipo de reflexão. Por isso que eu acho que
esse tipo de conceito ele é importante das pessoas entenderem, pelo
menos para tomar a decisão consciente. Falar assim: beleza, nesse contexto
aqui eu realmente vou olhar para a tarefa mesmo e é isso. Aqui eu tenho
um cara que faz a tarefa, eu quero otimizar a tarefa e ponto, toma essa
decisão conscientemente. Mas o exemplo de (inint)  da planilha
é muito ilustrativo. Muitas vezes, é outro clichê, tem aquela velha história
de a gente fazer isso a vida inteira porque quando eu cheguei aqui fazia
assim. E se você não dá essa olhada no trabalho, você corre o risco de fazer
um sistema complicadíssimo, faz exatamente como a planilha estava
fazendo, simplesmente porque aquilo era feito antes e ninguém reavaliou
se aquilo era o que deveria ser feito mesmo, que era o trabalho.
Vinícius Paiva: Então, Szuster, mas tem um aspecto interessante que eu
vejo, até tentando diferenciar alguns problemas que a gente citou aqui. Por
exemplo, quando você tem um produto que é B2C, em tese, vamos supor
que você tenha um nível de concorrência grande, você tem uma força
externa aqui que faz meio que se movimentar e levar isso ao extremo.
Porque o consumidor tem opções, se você não quiser fazer, beleza, não faz.
Mas num cenário que você é mais B2B, em tese, é diferente, porque quem
vai usar não tem tantas opções. Então, qual é o ponto maior de
convencimento? É uma necessidade, a pessoa vai ser mais produtiva ou ele
vai ficar mais feliz, ou o dado vai ficar mais correto, porque ele vai fazer com
mais atenção. Qual seriam os pontos de gancho em cenários assim?
Daniel Leto: Essa pergunta é muito boa, e eu até fiz uma interjeição
perguntando, ela é diferente? Justamente porque tem muitos tomadores
de decisão que acham que usuário não tem que querer, é uma coisa que a
gente escuta muito. Eu vou colocar isso aqui para rodar, isso aqui vai fazer
parte dos meus processos agora e o pessoal vai ter que usar. O que
acontece na prática muitas vezes? Os usuários passam a fazer aquilo que
você está obrigando. Por exemplo, um software de acompanhamento de
estruturas, que todo tem que fazer esse acompanhamento em campo com
a prancheta. Você pega e coloca na mão dele um tablet, agora você vai fazer
esse checklist aqui. Só que a prancheta é muito mais flexível. Se esse tablet
não for tão flexível quanto, ou se ele demorar muito para você voltar para
a base dele e ele fazer essa carga, a pessoa vai continuar fazendo em papel
e o que ela vai fazer é chegar e depois passar para o tablet porque ela é
obrigada a fazer. Na prática, você está dificultando o trabalho do seu
usuário ao invés de você melhorar a vida dele. Então, a gente vê muito, não
sei se dá para usar esse termo, mas talvez até um certo desprezo do pessoal
com a mentalidade mais conservadora nesse aspecto, de falar: aqui não
tem disso, não. Mas, na prática, o que você está fazendo é dificultando a
sua vida, porque a sua equipe vai performar menos porque ela vai ter uma
tarefa a mais para fazer. Então, mesmo nesses casos, vale muito a pena a
gente prestar atenção em quais trabalhos que o pessoal tem que realizar.
No caso desse monitoramento de estrutura, que ele tem que ser
inspecionado, o que essa pessoa precisa talvez é um espaço que seja
flexível, às vezes ela precisa de um negócio que só carrega rápido para ela
poder fazer outras coisas. É legal quando a gente para para pensar, porque
todo mundo fica feliz e, mais do que isso, seus usuários vão te dar feedback,
seus funcionários, no caso de gestões mais tradicionais, eles vão ser as
pessoas que vão trazer as ideias para você, porque ele está mais perto do
campo. Lembrando que essa máxima de não basta apenas perguntar, vale
também para os gestores de campo, para os gestores mais tradicionais. Não
adianta você só pedir ideia para os seus funcionários e daí a pouco você
obriga que eles façam um negócio que claramente piora a vida deles. Faz
sentido?
Marcelo Szuster: Eu acho interessante porque eu acho que tem o contínuo
aí. Num cenário de máxima competição por consumidores finais, é igual o
Vinícius falou, ele foi para o extremo, você tem que ouvir tudo mesmo,
senão você perdeu. Por outro lado, o cara não pode, dentro do B2B, ir para
o outro extremo, que é o que você comentou. Eu também imponho porque
é assim que as coisas têm que ser feitas aqui. E é por pragmatismo, não é?
É como você disse, se você quer melhorar uma inspeção em campo, você
quer melhorar a inspeção em campo, então você tem que entender a
situação da pessoa em campo. É óbvio, mas é tipo isso. Se você não quebrar
a cabeça para pensar como é que eu uso a tecnologia a favor do cara em
campo fazer uma melhor inspeção, mais segura, et, é quase que falar o
seguinte: então deixa ele continuar no papel e depois digitar em algum
lugar. Eu acho interessante porque a gente é muito pragmático na DTI, isso
para mim é uma visão pragmática mesmo, é o porquê de o cara estar
fazendo aquilo. Porque se no fundo para ele não interessa, não tem muito
o que mudar, então para que fazer esse tipo de investimento? O que eu
acho é que tem esse contínuo. Na verdade, nenhuma empresa que atende
o consumidor é assim, ela vai priorizar um tanto de coisa e vai tentar achar
o caminho, mas ela está mais sujeita a essa pressão, que eu acho que é o
que o Vinição quis colocar. E no B2E ela tem uma competição obviamente
menor, mas ela tem essa competição com o jeito antigo que o cara fazia e
tem a necessidade de transformar o cara e fazer o cara ficar mais produtivo
ou mais feliz. É igual o Vinícius falou, o cara vai feliz vai atender melhor um
cliente, por exemplo. Tem várias dimensões também que,
pragmaticamente, valem a pena o cara quebrar a cabeça para entender o
job to be done, separar a tarefa do trabalho, igual vocês comentaram, fazer
a experimentação, porque é assim que a empresa vai progredir. É uma visão
pragmática.
Vinícius Paiva: Um ambiente B2E, claro que cada caso é um caso, mas não
dá para negar que a pressão é menor. Mas também, não dá para negar, se
você está fazendo um projeto desses, você está querendo melhorar um
aspecto, enfim você está piorando, parece meio estranho. Eu acho que tem
um valor muito grande também essa mentalidade, querer entender melhor
os porquês e definir melhor o que você está tentando resolver ali, usar
técnicas de design (inint) , esse tipo de coisa, porque às vezes a
solução pode ser que não tenha nada a ver com o software. Vou dar um
exemplo bem concreto. A gente estava discutindo qual vai ser o papel do
escritório da DTI daqui para a frente. A gentes estava discutindo com o
pessoal de facility e a gente estava: será que a gente compra um desses
softwares de alocação de espaço? A gente até pensou, num tempo, de
colocar na (inint) , a nossa ferramenta interna. Mas tem um
aspecto, eu não sei se daria para falar que é um job to be done, de que se
você não usa software para isso e define espaços para cada uma das tribos
ou alianças, vai ser muito mais ineficiente. Mas, ao mesmo tempo, traz um
caráter simbólicos, de simbolismo básico, que pode ser extremamente
interessante. E se eu seguir para um modelo desses, provavelmente eu não
preciso de software, eu descentralizo a tomada de decisão para as tribos e
alianças, eles vão anotar num quadro, sei lá, e não vão precisar de software.
Então, a mera questão de você ter uma mentalidade de ficar o tempo todo
pensando com essa mentalidade, traz um formato de solução bem
interessante.
Daniel Leto: Nem sempre o concorrente é tão óbvio igual a gente acha que
é.
Marcelo Szuster: Exatamente.
Daniel Leto: Igual no caso do exemplo do milkshake, o concorrente poderia
ser uma banana, podia ser uma barra de Snickers ou podia ser um bagel.
Marcelo Szuster: Excelente. Infelizmente, nós estamos chegando aqui ao
final. Passa rápido, eu gostei muito da discussão. E, engraçado, para mim,
eu gostaria de fechar fazendo a seguinte reflexão. A gente fala muito aqui
assim, as empresas entendem que elas estão num ambiente mais
complexo, que elas têm que inovar mais, que elas têm que avançar mais.
Para isso, você tem que botar mais gente no jogo. Botar mais gente no jogo
é fazer mais gente, no mínimo, saber sobre o que ela tem que refletir. Eu
acho engraçado que isso é tão óbvio por um lado e tão difícil na prática de
colocar, justamente porque as estruturas elas tendem a manter o status
quo e elas tendem a encapsular a pessoa dentro de uma caixinha e a pessoa
fica ali eficientemente fazendo o que ela já fazia. O que nós estamos falando
aqui é o seguinte, no contexto de uma transformação digital, de uma
empresa ficar mais competitiva, dela entender que o ambiente dela é mais
complexo: se você quer realmente prosperar nesse ambiente, você vai
botar mais gente no jogo, e botar mais gente no jogo é fazer minimamente
essas pessoas saberem pensar melhor sobre o problema, saber elaborar
mais hipóteses, saber descobrir o caminho, colhendo mais evidências. É
disso que nós estamos falando quando a gente fala de produto. E não as
pessoas simplesmente entregarem uma encomenda de alguém que
supostamente sabe a solução e que é isso que vai acontecer, que a empresa
vai continuar no mesmo lugar. E depois alguém não entende por que a
empresa não entende de lugar, não tem jeito de mudar de lugar assim. Eu
queria agradecer muito, eu acho que foi uma ótima reflexão. Não sei se foi
a primeira, mas espero que o Leto, o Vini Barbi possam participar várias
vezes aqui. Grande abraço para vocês e um grande abraço para o Vinição
também.
Vinícius Paiva: Falou, pessoal. Bacana demais.
Vinícius Barbi: Valeu, gente. Obrigado pelo convite, espero voltar mais
vezes.
Daniel Leto: Posso só fazer uma recomendação de leitura?
Marcelo Szuster: Claro, fique à vontade.
Daniel Leto: Para quem quiser saber um pouquinho mais sobre isso, Muito
Além da Sorte, do Clayton Christensen, explica tudo isso que a gente falou
aqui, com mais detalhes, mais aplicabilidade, mais exemplos.
Marcelo Szuster: Bacana. Abração.
Marcelo Szuster: Bom dia, boa tarde, boa noite, vamos começar mais um
episódio de Os Agilistas. Hoje, nós vamos mais uma vez falar sobre gestão
de produtos, que é um tema tão importante hoje para todas as empresas.
A gente sabe que as empresas, para caminharem nessa jornada de se
tornarem digitais, se tornarem mais customer centric, tanto para atender
os próprios clientes internos, quanto os clientes externos, cada vez mais
elas têm que ter uma visão mais de longo prazo, pensar menos em projeto
e mais em produto. Então, esse é um tema que acaba sendo recorrente, a
gente já fez outros episódios aqui, e, hoje especificamente, a gente quer
falar sobre como é que a gente no final das contas entende, encontra
realmente as necessidades dos nossos usuários e dos nossos clientes, como
é que a gente faz para realmente descobrir isso. Para poder falar sobre esse
tema, como sempre, aqui o Vinição. E aí, Vinição, beleza?
Vinícius Paiva: E aí, pessoal, tudo bom?
Marcelo Szuster: E temos aqui dois representantes da DTI, com muito
conhecimento teórico e prático de gestão de produtos, que vão se
apresentar agora para a gente poder começar a conversa logo na
sequência. Estamos aqui com Daniel Leto. Tudo bom, Leto.
Daniel Leto: Opa, Szuster.
Marcelo Szuster: Se apresente, por favor, cara. Fala rapidinho sobre o seu
background, só para o pessoal te conhecer.
Daniel Leto: Eu sou product manager aqui na DTI, estou aqui desde o início
deste ano. Trabalho com gestão de produtos desde o final de 2018. Sou
engenheiro de formação, passei muito tempo indo para a indústria,
vestindo as botas, os antichamas, capacetes, conheço um pouquinho da
realidade, mas aí vim para essa área de produto, que é um negócio que me
deixa bastante empolgado. Especificamente, gosto bastante da área de
dados, hoje estou até fazendo mestrado em matemática computacional. É
mais ou menos isso aí.
Marcelo Szuster: Qual engenharia?
Daniel Leto: Engenharia elétrica.
Marcelo Szuster: É a melhor, não é, cara? É a que eu fiz também. Essa é uma
brincadeira que eu sempre faço. Estamos aqui também com Vinícius Barbi.
E aí, Barbi, tudo bom?
Vinícius Barbi: Fala aí, gente, tudo bem? Não sei nem se eu tenho roupa
para estar aqui.
Marcelo Szuster: E aí, Barbi? Aproveite e se apresente aí também, cara,
conta um pouquinho sobre o seu background.
Vinícius Barbi: Eu me formei em design gráfico e, desde a formação, fui cada
vez migrando para o lado do digital de alguma forma. Passei um tempo da
minha carreira trabalhando com animação e foi isso que acabou me
jogando dentro de interfaces e experiência do usuário. Quando cheguei na
DTI, comecei a atuar como designer de produto e agora também estou
fazendo um pouco de um trabalho que a gente fez de transformação digital
dos clientes.
Marcelo Szuster: Então, pessoal, vocês veem, nós temos duas pessoas
trabalhando com produtos, de áreas diferentes, de backgrounds diferentes,
e isso é uma coisa que a gente cada vez mais vê acontecendo na DTI e nesse
mundo do digital. Várias transições de carreira e várias trajetórias bem
interessantes. A gente já falou também muito sobre isso aqui, no podcast.
Eu queria começar fazendo pergunta para o Leto sobre como que a gente
entende, de fato, as necessidades do cliente? Existe a teoria do jobs to be
done, seria interessante você explicar isso. Porque é uma pergunta
interessante, ou seja, o que é uma necessidade mesmo, como é que a gente
faz para entender isso, é só perguntar para um cliente ou para um usuário
o que ele quer ou tem que descobrir de alguma outra forma? Como é que
a gente lida com isso, Leto?
Daniel Leto: A resposta curta para essa pergunta é não, não é só perguntar
para ele. Mas a boa notícia é que a gente tem algumas técnicas que
permitem que a gente seja um pouco mais assertiva em identificar o porquê
de as pessoas comprarem o produto. Contando uma historinha rápida, não
tem como a gente falar de jobs to be done sem falar do Clayton Christensen,
que foi um professor da HBS, Harvard Business School, que foi o pai dessa
teoria. Ele tinha uma empresa de consultoria que atendia grandes
empresas. E a história de como surgiu essa questão de teoria do trabalho,
que nada mais é do que um trabalho de empatia com os seus usuários, foi
quando ele foi chamado para dar consultoria no Mcdonalds, e o Mcdonalds
queria aumentar a quantidade de vendas do milkshake que eles tinham. O
Mcdonalds, eu acho que não é segredo para ninguém, é uma empresa
gigante, eles têm um zilhão de dados na base deles. O que eles fizeram foi
rodar aquele método tradicional: fizeram uma pesquisa de satisfação com
os usuários, no caso, quem ia comer no restaurante deles lá, e coletaram
alguns feedbacks, perguntaram para alguns usuários e fizeram as
modificações de acordo com o feedback que o pessoal deu. Para a surpresa
da equipe, as vendas não aumentaram em absolutamente nada, mesmo
depois de ir colocando coisas mais legais, colocando milkshakes mais
pedaçudos, et cetera. Então, o que eles fizeram? Ao invés de eles
simplesmente perguntarem para as pessoas, eles colocaram uma equipe
fazendo sombra. Sombra, para quem não sabe, é quando você vai para
campo, vê o usuário utilizando o seu sistema, no caso, acompanhando as
pessoas na jornada delas completa. Fizeram as perguntas, foi uma sombra
até que eles ficam se gabando, de 19 horas direto, chegaram lá bem de
manhã, cedinho, e começar a perguntar para as pessoas. Anotar: chegou de
carro, chegou a pé, veio sozinho, veio de galera, tomou só o milkshake, ficou
aqui na loja e levou para fora, que é o tipo de coisa que a gente não costuma
pegar com dado, não seria possível de fazer isso, ainda mais na época que
isso foi criado. Se eu não me engano, foi em torno de uns 15 a 20 anos atrás
esse episódio. E para a surpresa do pessoal, a maioria dos milkshakes era
consumido na parte da manhã, por pessoas que chegavam sozinhas e de
carro. Quando eles fizeram esse compilado dessas informações, com
entrevistas de campo em conjunto com os dados que eles avaliaram. Então,
eles começaram a perguntar por que as pessoas estavam consumindo
milkshake de manhã e sozinhas, porque não é um negócio que é óbvio.
Mesmo para a cultura gastronômica do pessoal dos Estados Unidos, é um
negócio que é relativamente pesado para você começar o dia. Algumas
pessoas falaram que: eu como banana, mas banana me dá fome no meio
da manhã; eu como bagel, mas eu já levanto de casa atrasado e bagel, para
quem não sabe, é uma rosquinha salgada, parece um pão, muito seco, e
eles tinham que dirigir passando cream cheese no negócio ao mesmo
tempo, não dava muito certo; tinha gente que comia Snickers. Enfim,
tinham diversos outros produtos que eram contratados para esse trabalho,
para ajudar os usuários a fazerem coisas mais legais. E descobriu-se, então,
que, na verdade, as pessoas não compravam milkshake através desses
dados. A conclusão que a equipe de consultoria chegou foi que as pessoas,
na verdade, elas contratavam o milkshake para fazer companhia para elas
no caminho para o trabalho e, de quebra, a maioria das pessoas ficavam
cheia até mais ou menos na hora do almoço e tinha alguma coisa para
manter distraído. Então, o que a equipe fez? Ao invés de fazer essas
modificações do Mcdonalds, de colocar mais caramelo, essas coisas assim,
eles colocaram coisas que manteriam as pessoas mais distraídas no
caminho para o trabalho. Então, reduziram a espessura do canudo,
colocaram uns pedaços de frutas, não por ser saudável, mas por ter coisas
para mastigar para você se distrair, e colocaram uma fila de, se eu não me
engano, self-checkout para as pessoas que fossem comprar essa parte das
sobremesas. Resultado: as vendas explodiram e todo mundo ficou feliz no
fim das contas. Moral da história: as pessoas não contratam o seu produto,
elas pegam o seu produto emprestado para fazer a vida delas melhor de
alguma forma. E é daí que saiu essa tal dessa teoria do jobs to be done.
Marcelo Szuster: Interessante. Eu lembro dessa história também que, num
outro horário, sei lá, tinha uma parte assim também, o Vinição inclusive
deve vivenciar, agora na pandemia não, era o contrário: o cara leva o filho
depois do dia de trabalho, está cansado, e aí o job to be done é ele ter um
entretenimento com o filho. E aí, se você desse o mesmo milkshake que o
cara demora para tomar, o menino não consegue tomar e a vida vira um
inferno, porque você não consegue ficar com as crianças num lugar desse
muito mais que meia hora, uma hora, que eles vão ficando incomodados.
Então isso, eu acho que tem uma mensagem interessante sobre, no fundo,
o produto não tem necessariamente um valor intrínseco, não é? A gente
tenderia a pensar que sempre o job to be done seria que ele tem que
cumprir um desejo e um gosto bom do milkshake. Eu falo assim, a tendência
de todo mundo, não sei se vocês concordam, é pensar muito assim: se eu
tiver o melhor milkshake do mundo, pronto, resolvi o problema. E não é
isso. O que o Mcdonalds fez, que você está falando, foi que de manhã cedo
era melhor um milkshake espesso, que durasse mais, para o cara ter
companhia, e num outro horário é melhor um milkshake para criança, que
pode ser até mais doce mesmo, que criança gosta de coisa mais doce, não
é?
Vinícius Paiva: Deixa eu só fazer uma observação aqui, nem tem a ver com
para onde o assunto caminha, mas é uma analogia boa. Eu não sei o tanto
que você está avacalhado do jejum intermitente, mas eu ainda estou
tentando seguir um pouco. Mas aquele cara, eu acho que você leu o livro
também, David Sinclair, Lifespan, esses dias ele postou no Twitter, ele fala
assim, take hot drinks, alguma coisa assim. Que, no fundo, ele cumpre esse
papel, o hot drink cumpre esse papel de não que ele vai te saciar, é um
pouco desse papel da companhia, ele tem o papel da pausa, daquele ritual
de você fazer uma pausa e tomar alguma coisa. E, por exemplo, para mim,
funciona muito bem. De manhã, eu antes fazia exercício, para cumprir o
ritual de fazer alguma coisa de manhã, eu tomo um café e me satisfaz a
necessidade de ter aquela pausa, aquele rito.
Marcelo Szuster: E se é quente, você toma devagarinho, não tem como, a
não ser que você seja um pouco doidão. (Inint)  perguntando, só
para eu colocar o Barbi na conversa também, se ele concorda com essa
questão desse valor intrínseco, ou seja, então a gente tem que talvez tirar
o foco desse valor intrínseco e pensar a partir de uma outra perspectiva. É
isso mesmo?
Vinícius Barbi: Eu acho que é. Eu acho que, na verdade, essa questão do
jobs to be done ela acaba ajudando a gente a entender qual é o valor de
verdade que aquelas pessoas veem naquele produto. Que talvez, se a gente
fosse falar do milkshake, pensando na experiência de consumir esse
milkshake, a gente nunca diria que um milkshake cheio de pedaço, que dá
trabalho de conseguir consumir, que vai te fazer demorar, se você não
soubesse dessa relação dos usuários com isso, você nunca diria que esse é
o melhor milkshake. E, no fundo, o melhor produto ali, naquele momento,
era um produto que desse trabalho, que está muito longe do que a gente
imagina de experiência ideal.
Daniel Leto: O que acontece é que muita gente acaba acertando sem
querer, não é? Vende muito e acha que é por conta de uma característica,
mas na hora que você vai ver é por causa de outra.
Marcelo Szuster: Frustrante, não é? O cara, achando que é o rei dos
milkshakes.
Vinícius Barbi: Ele só fez um milkshake que dava trabalho de beber.
Marcelo Szuster: É, nesse caso, é até irônico, não é? Aumentou a fricção. A
gente fala que tem que diminuir a fricção para tudo, nesse caso aumentou
a fricção para o consumo do milkshake. Vocês conseguem pensar agora em
algum exemplo mais próximo que vocês tenham vivenciado no mundo de
produtos digitais, onde essa abordagem tenha mostrado uma diferente
necessidade?
Vinícius Barbi: Eu acho que eu tenho um exemplo que a gente vive muito
no cliente que é a tal da planilha do Excel. Se você perguntar para todas as
pessoas que a gente tem entrevistado dos nossos produtos, ou nas áreas
que a gente tem atuado, todo mundo fala que o que eles têm que fazer é:
eu preciso colocar esses dados do Excel em algum lugar. E quando você vai
ver e avaliar aquilo ali a fundo, nunca é sobre escrever o dado no Excel, é
sempre sobre alguma coisa que está por trás daquilo, ou uma análise que
vai ser feita, ou alguma forma que aquele dado vai ser transformado e
alimentar algum outro processo. Eu acho que acaba tendo um pouco disso
no dia a dia, de entender a motivação por trás de alguém está fazendo o
que ela faz, ajuda a gente a fazer um produto que às vezes a pessoa nem
esperava que podia ser um produto. No fundo, as pessoas estavam achando
que elas iam ganhar uma planilha do Excel melhorada, e aí você faz um
outro produto que não tem nada a ver com aquilo, que é sobre visualização
de dados ou sobre a automação de algum outro processo que estava no
backstage desse processo, e que acaba sendo ali que se gera muito valor
mesmo.
Daniel Leto: É impressionante como é que a gente vivencia isso,
especialmente em clientes mais tradicionais. Quando a gente está falando
de consultorias ou integradoras de software, eu escutei alguém falando
esses dias, a gente normalmente chega enxergando só um pedacinho da
jornada. Porque como é que normalmente nascem essas coisas? Alguém
tem alguma ideia nas áreas de negócio, o pessoal junta com a TI, decide o
que vai ser feito e só na hora de implementar, na hora de fazer o delivery
de fato, eles entregam para uma empresa terceirizada, para ela poder fazer
o desenvolvimento do software, mas esquece que parte do ganho vem
justamente de todos os atores envolvidos em todas as etapas. Esse exemplo
que o Vinícius deu é excelência, da tal da planilha de Excel. Esses dias eu vi,
inclusive, uma demanda que chegou mais ou menos assim para a gente: a
gente precisa implementar essa integração com essa planilha de Excel. Era
um negócio que era até legal, ele puxa os dados da planilha do Excel e você
consegue fazer os lançamentos através de uma ferramenta que todo
mundo usa. Mas, na prática, o que o pessoal precisava já existia em outro
sistema, mas eles não usavam porque eles precisavam logar em outro
sistema. Às vezes, o produto que as pessoas contratam, a teoria do trabalho
fala muito disso, ele só é contratado a partir do momento que ele é tão bom
ou melhor do que as pessoas já fazem. Então, se as pessoas já usam a
planilha de Excel, para que eu vou logar em outro lugar, mesmo que dê mais
trabalho para mim, não é? O gatilho mental, o esforço que isso leva, ele é
simplesmente muito maior do que simplesmente continuar fazendo as
coisas na rotina.
Vinícius Paiva: Vocês citaram esse exemplo do milkshake, que o pessoal
identificou essa questão da necessidade muito baseado em observação. O
que vocês diriam sobre método para isso? Normalmente, é mais por
observação, é mais, vocês falaram no início, sobre a questão de
questionários. Qual é o papel de você fazer via questionário, qual é o papel
de você fazer de uma forma talvez um pouco mais sofisticada, mais baseada
em comportamento?
Vinícius Barbi: Eu acho que assistir as pessoas fazendo o que elas fazem em
algumas situações vão render esse tipo de informação para a gente, que eu
acho que é a situação do Mcdonalds. Mas tem horas que a gente precisa de
uma entrevista em profundidade, entender um pouco do negócio que está
acontecendo em volta daquilo que está sendo feito. Eu acho que essa
pesquisa, não só necessariamente perguntando para alguém, mas uma
pesquisa de compreender do negócio e aprender realmente sobre aquilo,
pelo menos me ajuda demais a entender esses jobs to be done das coisas
que a gente tem feito. Principalmente se é algum processo complexo,
alguma coisa que não é óbvia, não está muito no nosso dia a dia se a gente
não trabalhasse com as equipes que a gente trabalha, é muito difícil você
escutar alguém falando que ela vai preencher uma planilha e associar com
a razão real daquilo que está sendo preenchido ou onde que aquilo gera
valor.
Vinícius Paiva: É por isso que a gente reforça muito essa ideia da filosofia da
TI de trazer os líderes para as trincheiras também, justamente para a gente
poder ter uma visibilidade. E aqui, a gente não está desprezando a
importância de decisões data driven, pelo contrário, só que a gente sabe
bem que computadores são limitados perto do que a ação humana pode
fazer de fato. E, dentro do que o Vini até mencionou agora, além disso tudo,
muitas vezes a gente consegue chegar nesse tipo de coisa perguntando o
porquê. Normalmente, a gente pergunta: o que você quer que constrói?
Mas, na prática, o que a gente deveria estar perguntando? Por que você
precisa disso? Porque isso dá muito mais margem para as pessoas terem
amplitude de responder coisas que você não perguntou.
Vinícius Barbi: É: por que você faz o que você faz no trabalho?
Marcelo Szuster: Pessoal, queria lembrar a todos que estão nos ouvindo
que os episódios de Os Agilistas também estão disponíveis no Youtube. Lá,
você assiste esse e outros episódios, além de ter acesso ao conteúdo de
nosso podcast de forma visual. Além de nos ouvir, agora você pode nos
assistir, é só procurar Os Agilistas, se inscrever e ativar as notificações para
receber nosso conteúdo em primeira mão.
Marcelo Szuster: Isso traz outros problemas sérios que a gente vê que as
organizações têm que precisam ser combatidos. Ou seja, um é sobre a visão
fragmentada, vocês acabaram citando isso. Poxa, às vezes a pessoa que está
pedindo ali tem uma visão fragmentada, é um negócio curioso. Eu já
participei de dinâmicas aqui que, na dinâmica que envolvia o líder, ou seja,
a gente deu um jeito de trazer o líder para a trincheira, pelo menos durante
a dinâmica, foi a primeira vez que alguém descobriu certas intenções da
liderança, o que, no fundo, estava por trás do que ele fazia. Porque nesse
modelo mais mecanicista, acaba que muitas empresas são construídas
assim. Se o cara está fazendo o pedacinho dele, está bom e ele fica sem
saber o porquê e tem uma visão fragmentada. A outra, emendando com
isso, é justamente esse porquê. Tem empresa que se o cara perguntar por
que, é quase que ele está sendo ineficiente. O cara é tarefeiro, ele tem que
ser, você tem que fazer, você não tem que perguntar por que. Então é
curioso, porque isso mostra que para você fazer um bom produto, que
realmente atenda às necessidades de negócio da empresa, e
consequentemente quem está desempenhando aquele determinado
papel, você tem que ter essa visão de tentar quebrar essa fragmentação e
trazer mais conhecimento. Então, eu imagino que essas ferramentas de
jornada, de empatia com persona, tudo isso contribui como método
também, que tinha a ver com a pergunta do Vinição, para poder aproximar
mais da possibilidade de responder essas perguntas. Vocês concordam?
Vinícius Barbi: Eu concordo demais. Todo o trabalho que a gente faz quando
a gente olha para o lado de design, de entender necessidade de usuário,
mapear persona, enfim, essa proximidade com o usuário, eu acho que está
diretamente relacionado com o que a gente faz quando a gente fala de jobs
to be done. Porque se você não entende como aquela pessoa pensa, por
que ela faz as coisas, você não vai conseguir criar nem empatia com o que
aquela pessoa precisa fazer para que realmente se faça um bom produto.
Não sei se o Leto tem algum outro ponto.
Vinícius Paiva: É exatamente isso em termos práticos. Porque quando a
gente fala disso, algumas pessoas podem pensar: está abraçando árvore.
Não é bem assim, especialmente em ambientes mais conservadores.
Muitas vezes, o que isso quer dizer na prática, usar a teoria do trabalho, é
a gente trazer uma reunião semanal que envolva o time técnico também. A
gente fala aqui muito, na nossa tribo, que discovery não é uma atividade de
design, por exemplo, discovery é uma atividade do time inteiro, é uma
filosofia, todo mundo tem que estar ali avaliando quais são os quatro riscos
de produto. Pensando um pouquinho em golden circle, que as pessoas
compram o porquê de você fazer as coisas, isso vale mesmo para ambientes
internos, de produtos business to employee. Às vezes, na prática, isso quer
dizer trazer o cliente para dentro também, ou o time para fora, colocar todo
mundo para conversar justamente para gerar essa empatia. Quantas vezes
já não aconteceu, às vezes não precisa ser nem no trabalho. Você fica bravo
com alguma coisa e na hora que você conversa com a pessoa você descobre
que ela tem motivo para aquilo. É a mesma coisa aqui.
Vinícius Paiva: Eu ainda fico um pouco intrigado sobre essa questão. Vocês
colocaram esses métodos de questionamento, tentando chegar no porquê,
eu fico pensando assim, tudo bem que nesse exemplo que vocês deram do
milkshake, foi uma observação quase que do status quo, uma coisa que já
estava sendo executada. E quando é uma coisa, você está inventando
alguma coisa, as pessoas vão acabar criando uma série de narrativas. Ela
não sabe bem o porquê, mas ela vai ficar: eu acho que é por causa disso.
Ela vai ficar respondendo alguma coisa ali que ela racionalizou. Fica me
parecendo que tem um papel gigantesco de importância em relação a
observação e experimentação de propostas. Vamos tentar esse aqui, não
vou ficar perguntando, vou observar o comportamento, como que a pessoa
reage em relação a isso, até descobrir alguma necessidade. Como a gente
tem clientes, negócios que o pessoal está inventando produtos novos,
formas diferentes de gerar receita, o ambiente é bem mais desestruturado.
Eu queria só que vocês explorassem um pouco mais o papel disso. Inclusive,
o Leto colocou essa questão de negócios B2E, ou até negócios B2B, onde o
universo de experimentação é pouco mais restrito, como é que funcionaria
nesses casos? Como é que vocês abordam esses problemas?
Daniel Leto: Essa é a pergunta de um milhão de dólares: como é que a gente
descobre esses jobs to be done? Na verdade, tem várias formas. Mas,
quando a gente está falando de produtos mais novos, uma coisa que a
gente já descobriu aqui que tem chances boas de funcionar, que a gente
não trabalha com certeza, mas com validação de hipóteses, é a gente
trabalhar com uma visão de produto que gaste pouco, mas seja efetiva. O
que eu chamo de visão de produto? Não estou falando de uma lista de
requisitos, eu estou falando de uma coisa que seja inspiradora para as
pessoas, principalmente quem for comprar a ideia, que efetivamente for
pagar a conta, é isso que eu preciso. Ou, no mínimo, a pessoa vai ver aquilo,
que é o nosso entendimento, DTI, em relação àquele problema, depois de
uma série de problem framings, e fala: não, isso não me atende, eu queria
isso. Isso ajuda a gente a direcionar melhor. É óbvio que se a gente tiver um
gestor com bastante poder que já esteja enviesado, a gente vai acabar
fazendo o que foi feito para fazer, e pode ser que ele tenha motivo para
aquilo, esse motivo pode variar desde motivos pessoais dentro da empresa
de crescimento, até outros motivos, como por exemplo ter que fazer o
desligamento de alguma coisa que vai dar muito problema se não desligar.
Nessas horas, a gente tem que ficar de olho, tentar entender por que essas
visões chegam enviesadas. Mas, na prática, uma visão de produto pode ser
um protótipo de alta fidelidade. A gente tem caso bom de sucesso aqui que
ao invés de a gente propor uma série de requisitos, a gente chegou lá e
apresentou na reunião um protótipo navegável de alta fidelidade. O pessoal
bateu o olho e falou: é exatamente isso que eu preciso. E deram os devidos
feedbacks.
Vinícius Barbi: Esse tipo de protótipo, quando a gente não tem muito,
vamos falar assim, uma diretriz clara, ele era um protótipo de muito alta
fidelidade, mas não fidelidade técnica, a gente não tinha muita certeza se
os requisitos técnicos eram realmente aqueles ou não. Ele estava ali muito
só para tentar suprir o que a gente escutou durante o processo de
discovery, que eram as dores, as necessidades das pessoas que estavam ali
envolvidas. Então a gente estava, no fundo, tentando entender ainda um
pouquinho o porquê as pessoas faziam o que elas faziam.
Marcelo Szuster: Interessante esse ponto seu. Desculpa, completa aí, Barbi.
Eu chamo você de Barbi e Leto chama você de Vini.
Vinícius Barbi: O pessoal que estiver ouvindo vai achar que tem, no mínimo,
umas sete pessoas participando da ligação. A gente estava só fazendo um
protótipo que servia para mostrar um pouquinho que isso aqui é o que a
gente entendeu do que você falou para a gente. A gente vai tentar detalhar,
refinar e tentar entender as minúcias técnicas de como executar e até talvez
algumas das definições, mesmo que fossem visuais, mais para frente. A
gente só precisa que você confirme para a gente: a gente entendeu direito
o que você precisa disso?
Marcelo Szuster: Estamos no caminho certo? Esse ponto eu acho
superinteressante. É por isso que o processo se chama descoberta,
ninguém sabe, está descobrindo. E descobrir significa entender
gradualmente. Eu acho que isso é uma outra dificuldade que existe, porque
muitas vezes já se espera que se saiba a solução imediatamente ou que, ao
fazer um discovery, o discovery vai ser uma mágica, você já vai sair de lá
com uma solução. Se você pensar na palavra descoberta, é assim: juntos
estamos descobrindo. Esse protótipo mostra que entendemos até aqui,
será que o caminho é esse? Parece que é. Isso é difícil de convencer as
pessoas por causa dessa necessidade de certeza. Aí vai lá no episódio da
maldição do escopo, remete a um tanto de coisa. Mas, vocês concordam?
Eu acho que esse ponto, é muito interessante para quem está ouvindo
refletir sobre isso. É igual quando a gente fala que hipótese é diferente de
requisito, quando você bota hipótese ou já muda a linguagem. Quando você
fala num processo de descoberta, eu acho que todo mundo deveria
entender que já se parte de uma posição de saber o seguinte: eu não sei
exatamente o que eu quero, eu tenho que ir descobrindo. Inclusive, a gente
defende que a descoberta seja contínua, porque com um produto mais
complexo, de longo prazo, você vai fazer várias descobertas, não é só uma.
Como é que vocês enxergam isso?
Vinícius Barbi: Eu acho que não só tem esse apreço, amarração, não sei qual
é a palavra, com saber a solução, mas como se tenha uma única solução.
Quando a gente fez esse processo que a gente citou, eu acho que a gente
tinha uma lista de quatro ou cinco coisas que a gente entendia que
resolviam de alguma forma aqueles problemas que a gente estava ouvindo
e a nossa expectativa era validar uma depois da outra. Era testar uma,
entender se era aquilo ou não, testar a próxima e a próxima. Eu acho que é
um pouco perder até essa expectativa de que tenha que ter uma resposta
única. No final das contas, a gente descobriu que tem N outras coisas que o
produto pode fazer no futuro, mas só que uma delas respondia de imediato
a necessidade.
Daniel Leto: A gente até cai naquele clichê de a gente apaixonar pelo
problema e não pela solução. Mas mesmo esse tipo de clichê é um negócio
que não está bem fundamentado na maioria dos lugares. Por que eu estou
falando disso? Porque na hora que você para para pensar, processos de
discovery são muito parecidos com processos de método científico, que é
um negócio que não é novo para ninguém. O que, na prática, você faz é
você entende um problema que você tem, você modela esse problema e
depois você ataca esse problema com possíveis soluções da forma menos
enviesada possível. E acaba caindo nisso que o Barbi mencionou de a gente
não ter uma solução única, às vezes tem mais de uma forma de a gente
resolver o mesmo problema e a gente tem que estar sempre aberto a
conseguir pivotar se a gente achar alguma coisa melhor. Obviamente,
avaliando o custo que a gente vai ter de pivotar, dependendo de qual fase
de implementação, de delivery a gente estiver. Eu sempre brinco com a
galera, às vezes pivotar ou desistir de alguma coisa que a gente vê que não
está dando certo é um ato de coragem também. Você falar, isso aqui não
vai funcionar, isso aqui não faz sentido eu conseguir, é falar a verdade e
tentar ser transparente em relação a isso também.
Vinícius Barbi: Essa diversidade de soluções, eu acho que ela também tem
muito a ver com a gente estar tentando criar um produto em volta de um
trabalho, de um job to be done. Quando a gente tenta fazer uma tarefa, ele
vai ter uma cara muito mais rígida, a solução vai parecer muito mais rígida,
ela não vai ter essas múltiplas possibilidades diferentes de resolver o
mesmo problema. Porque, no fundo, você estar digitalizando uma tarefa é
isso, é digitalizar ela, é pegar o dado e escrever na planilha. Quando você
tenta resolver o job to be done da pessoa, é muito além disso. Você pode
ter um produto que seja escrever na planilha, o outro que seja movimentar
o dado de uma outra forma, ou que possa até ser mudar a forma como o
dado é coletado, talvez também resolva o problema do mesmo jeito. Eu
acho que começa a ter essas várias características de soluções de produto
muito diferentes porque a gente, durante o processo de discovery, a gente
foi pensando o que era esse job to be done.
Daniel Leto: Talvez valha a pena a gente explicar para os ouvintes, isso é
uma confusão comum, qual que é a diferença de tarefa para trabalho.
Vinícius Barbi: Talvez faça sentido. Foi a hora que eu entendi o que era a
diferença dessas duas coisas que ficou claro para mim: ok, é por isso que o
Leto não para de bater nessa tecla. O cara não parava de falar de jobs to be
done e eu não entendia o porquê que isso era tão relevante. Não me
parecia importante, aí eu falei: não, entendi, é por isso, é porque tarefa e
trabalho são duas coisas completamente diferentes. Não sei se você quer
explicar a diferença.
Daniel Leto: Eu achei que você fosse explicar.
Vinícius Barbi: No próximo episódio.
Marcelo Szuster: Explica aí.
Vinícius Barbi: Estou gerando engajamento.
Daniel Leto: Eu vou botar a galera para queimar um pouquinho de fosfato
porque isso não é algo trivial. É simples de entender, mas na prática, a gente
aplicar, nem sempre é isso. Mas tarefa é qualquer coisa repetitiva, que você
vai fazer no dia a dia. Exemplo, de novo caindo nos clichês, mas eu acho que
vale a pena a gente repetir até isso ficar internalizado, por que as pessoas
compram uma furadeira? É uma pergunta filosófica até, mas muita gente
vai responder: para fazer o furo. Mas furo é uma tarefa, você precisa fazer
o furo para fazer alguma coisa, ninguém faz um furo na casa porque acha
bonito, para decorar. Pelo contrário, se eu fizer isso aqui a minha esposa vai
me botar para fora de casa.
Marcelo Szuster: Você tem vontade de fazer um furo aí.
Daniel Leto: Primeiro que vai fazer barulho, segundo que vai fazer sujeira,
terceiro que vai ficar muito feio. Mas todo mundo quer instalar um suporte
de TV, e você descobrir qual suporte de TV que as pessoas querem instalar,
isso é o trabalho. Parece abstrato, mas é muito mais fácil a gente definir
com exemplos. Então, sugestão para quem estiver nesse meio de produtos
e tentando fazer transformação cultural é tenta encontrar qual suporte de
TV seus usuários estão tentando instalar.
Marcelo Szuster: Isso que eu acho engraçado. Por que isso é tão difícil de
fazer no mundo corporativo e no mundo mais tradicional? Porque é um
foco tão grande na eficiência e em tudo estar tão predefinido que às vezes
essa pergunta é quase inaceitável. Eu acho importante trazer isso à tona,
por quê? Se alguém está investindo num produto digital e quer fazer a
diferença, ele tem que abrir espaço para poder reavaliar o trabalho e não
só digitalizar a tarefa. Eu até entendo, a gente até teve discussões assim,
pode ter momentos que você precisa de um ganho imediato. A gente é
pragmático, então pode ter momentos que você precisa de um ganho
evidente ali, você vai seguir o caminho mais evidente e falar: digitaliza isso
aqui que eu preciso disso. E não vai ter que dar, talvez, esse passo atrás.
Mas quando você pensa em uma transformação maior, mais profunda, você
tem que abrir espaço para esse tipo de reflexão. Por isso que eu acho que
esse tipo de conceito ele é importante das pessoas entenderem, pelo
menos para tomar a decisão consciente. Falar assim: beleza, nesse contexto
aqui eu realmente vou olhar para a tarefa mesmo e é isso. Aqui eu tenho
um cara que faz a tarefa, eu quero otimizar a tarefa e ponto, toma essa
decisão conscientemente. Mas o exemplo de (inint)  da planilha
é muito ilustrativo. Muitas vezes, é outro clichê, tem aquela velha história
de a gente fazer isso a vida inteira porque quando eu cheguei aqui fazia
assim. E se você não dá essa olhada no trabalho, você corre o risco de fazer
um sistema complicadíssimo, faz exatamente como a planilha estava
fazendo, simplesmente porque aquilo era feito antes e ninguém reavaliou
se aquilo era o que deveria ser feito mesmo, que era o trabalho.
Vinícius Paiva: Então, Szuster, mas tem um aspecto interessante que eu
vejo, até tentando diferenciar alguns problemas que a gente citou aqui. Por
exemplo, quando você tem um produto que é B2C, em tese, vamos supor
que você tenha um nível de concorrência grande, você tem uma força
externa aqui que faz meio que se movimentar e levar isso ao extremo.
Porque o consumidor tem opções, se você não quiser fazer, beleza, não faz.
Mas num cenário que você é mais B2B, em tese, é diferente, porque quem
vai usar não tem tantas opções. Então, qual é o ponto maior de
convencimento? É uma necessidade, a pessoa vai ser mais produtiva ou ele
vai ficar mais feliz, ou o dado vai ficar mais correto, porque ele vai fazer com
mais atenção. Qual seriam os pontos de gancho em cenários assim?
Daniel Leto: Essa pergunta é muito boa, e eu até fiz uma interjeição
perguntando, ela é diferente? Justamente porque tem muitos tomadores
de decisão que acham que usuário não tem que querer, é uma coisa que a
gente escuta muito. Eu vou colocar isso aqui para rodar, isso aqui vai fazer
parte dos meus processos agora e o pessoal vai ter que usar. O que
acontece na prática muitas vezes? Os usuários passam a fazer aquilo que
você está obrigando. Por exemplo, um software de acompanhamento de
estruturas, que todo tem que fazer esse acompanhamento em campo com
a prancheta. Você pega e coloca na mão dele um tablet, agora você vai fazer
esse checklist aqui. Só que a prancheta é muito mais flexível. Se esse tablet
não for tão flexível quanto, ou se ele demorar muito para você voltar para
a base dele e ele fazer essa carga, a pessoa vai continuar fazendo em papel
e o que ela vai fazer é chegar e depois passar para o tablet porque ela é
obrigada a fazer. Na prática, você está dificultando o trabalho do seu
usuário ao invés de você melhorar a vida dele. Então, a gente vê muito, não
sei se dá para usar esse termo, mas talvez até um certo desprezo do pessoal
com a mentalidade mais conservadora nesse aspecto, de falar: aqui não
tem disso, não. Mas, na prática, o que você está fazendo é dificultando a
sua vida, porque a sua equipe vai performar menos porque ela vai ter uma
tarefa a mais para fazer. Então, mesmo nesses casos, vale muito a pena a
gente prestar atenção em quais trabalhos que o pessoal tem que realizar.
No caso desse monitoramento de estrutura, que ele tem que ser
inspecionado, o que essa pessoa precisa talvez é um espaço que seja
flexível, às vezes ela precisa de um negócio que só carrega rápido para ela
poder fazer outras coisas. É legal quando a gente para para pensar, porque
todo mundo fica feliz e, mais do que isso, seus usuários vão te dar feedback,
seus funcionários, no caso de gestões mais tradicionais, eles vão ser as
pessoas que vão trazer as ideias para você, porque ele está mais perto do
campo. Lembrando que essa máxima de não basta apenas perguntar, vale
também para os gestores de campo, para os gestores mais tradicionais. Não
adianta você só pedir ideia para os seus funcionários e daí a pouco você
obriga que eles façam um negócio que claramente piora a vida deles. Faz
sentido?
Marcelo Szuster: Eu acho interessante porque eu acho que tem o contínuo
aí. Num cenário de máxima competição por consumidores finais, é igual o
Vinícius falou, ele foi para o extremo, você tem que ouvir tudo mesmo,
senão você perdeu. Por outro lado, o cara não pode, dentro do B2B, ir para
o outro extremo, que é o que você comentou. Eu também imponho porque
é assim que as coisas têm que ser feitas aqui. E é por pragmatismo, não é?
É como você disse, se você quer melhorar uma inspeção em campo, você
quer melhorar a inspeção em campo, então você tem que entender a
situação da pessoa em campo. É óbvio, mas é tipo isso. Se você não quebrar
a cabeça para pensar como é que eu uso a tecnologia a favor do cara em
campo fazer uma melhor inspeção, mais segura, et, é quase que falar o
seguinte: então deixa ele continuar no papel e depois digitar em algum
lugar. Eu acho interessante porque a gente é muito pragmático na DTI, isso
para mim é uma visão pragmática mesmo, é o porquê de o cara estar
fazendo aquilo. Porque se no fundo para ele não interessa, não tem muito
o que mudar, então para que fazer esse tipo de investimento? O que eu
acho é que tem esse contínuo. Na verdade, nenhuma empresa que atende
o consumidor é assim, ela vai priorizar um tanto de coisa e vai tentar achar
o caminho, mas ela está mais sujeita a essa pressão, que eu acho que é o
que o Vinição quis colocar. E no B2E ela tem uma competição obviamente
menor, mas ela tem essa competição com o jeito antigo que o cara fazia e
tem a necessidade de transformar o cara e fazer o cara ficar mais produtivo
ou mais feliz. É igual o Vinícius falou, o cara vai feliz vai atender melhor um
cliente, por exemplo. Tem várias dimensões também que,
pragmaticamente, valem a pena o cara quebrar a cabeça para entender o
job to be done, separar a tarefa do trabalho, igual vocês comentaram, fazer
a experimentação, porque é assim que a empresa vai progredir. É uma visão
pragmática.
Vinícius Paiva: Um ambiente B2E, claro que cada caso é um caso, mas não
dá para negar que a pressão é menor. Mas também, não dá para negar, se
você está fazendo um projeto desses, você está querendo melhorar um
aspecto, enfim você está piorando, parece meio estranho. Eu acho que tem
um valor muito grande também essa mentalidade, querer entender melhor
os porquês e definir melhor o que você está tentando resolver ali, usar
técnicas de design (inint) , esse tipo de coisa, porque às vezes a
solução pode ser que não tenha nada a ver com o software. Vou dar um
exemplo bem concreto. A gente estava discutindo qual vai ser o papel do
escritório da DTI daqui para a frente. A gentes estava discutindo com o
pessoal de facility e a gente estava: será que a gente compra um desses
softwares de alocação de espaço? A gente até pensou, num tempo, de
colocar na (inint) , a nossa ferramenta interna. Mas tem um
aspecto, eu não sei se daria para falar que é um job to be done, de que se
você não usa software para isso e define espaços para cada uma das tribos
ou alianças, vai ser muito mais ineficiente. Mas, ao mesmo tempo, traz um
caráter simbólicos, de simbolismo básico, que pode ser extremamente
interessante. E se eu seguir para um modelo desses, provavelmente eu não
preciso de software, eu descentralizo a tomada de decisão para as tribos e
alianças, eles vão anotar num quadro, sei lá, e não vão precisar de software.
Então, a mera questão de você ter uma mentalidade de ficar o tempo todo
pensando com essa mentalidade, traz um formato de solução bem
interessante.
Daniel Leto: Nem sempre o concorrente é tão óbvio igual a gente acha que
é.
Marcelo Szuster: Exatamente.
Daniel Leto: Igual no caso do exemplo do milkshake, o concorrente poderia
ser uma banana, podia ser uma barra de Snickers ou podia ser um bagel.
Marcelo Szuster: Excelente. Infelizmente, nós estamos chegando aqui ao
final. Passa rápido, eu gostei muito da discussão. E, engraçado, para mim,
eu gostaria de fechar fazendo a seguinte reflexão. A gente fala muito aqui
assim, as empresas entendem que elas estão num ambiente mais
complexo, que elas têm que inovar mais, que elas têm que avançar mais.
Para isso, você tem que botar mais gente no jogo. Botar mais gente no jogo
é fazer mais gente, no mínimo, saber sobre o que ela tem que refletir. Eu
acho engraçado que isso é tão óbvio por um lado e tão difícil na prática de
colocar, justamente porque as estruturas elas tendem a manter o status
quo e elas tendem a encapsular a pessoa dentro de uma caixinha e a pessoa
fica ali eficientemente fazendo o que ela já fazia. O que nós estamos falando
aqui é o seguinte, no contexto de uma transformação digital, de uma
empresa ficar mais competitiva, dela entender que o ambiente dela é mais
complexo: se você quer realmente prosperar nesse ambiente, você vai
botar mais gente no jogo, e botar mais gente no jogo é fazer minimamente
essas pessoas saberem pensar melhor sobre o problema, saber elaborar
mais hipóteses, saber descobrir o caminho, colhendo mais evidências. É
disso que nós estamos falando quando a gente fala de produto. E não as
pessoas simplesmente entregarem uma encomenda de alguém que
supostamente sabe a solução e que é isso que vai acontecer, que a empresa
vai continuar no mesmo lugar. E depois alguém não entende por que a
empresa não entende de lugar, não tem jeito de mudar de lugar assim. Eu
queria agradecer muito, eu acho que foi uma ótima reflexão. Não sei se foi
a primeira, mas espero que o Leto, o Vini Barbi possam participar várias
vezes aqui. Grande abraço para vocês e um grande abraço para o Vinição
também.
Vinícius Paiva: Falou, pessoal. Bacana demais.
Vinícius Barbi: Valeu, gente. Obrigado pelo convite, espero voltar mais
vezes.
Daniel Leto: Posso só fazer uma recomendação de leitura?
Marcelo Szuster: Claro, fique à vontade.
Daniel Leto: Para quem quiser saber um pouquinho mais sobre isso, Muito
Além da Sorte, do Clayton Christensen, explica tudo isso que a gente falou
aqui, com mais detalhes, mais aplicabilidade, mais exemplos.
Marcelo Szuster: Bacana. Abração.

Descrição

O sucesso de um produto ou serviço é consequência de conseguir identificar as reais necessidades do cliente. Nesse episódio conversamos sobre a teoria do Jobs to be Done e o impacto da observação e da experimentação para entender o consumidor. Assista também no youtube: youtube.com/osagilistas Instagram: @osagilistas